Paulão – A volta de quem não foi

Lendo Ciclos – As Forças Misteriosas que Guiam os Fatos, de Og Mandino e Edward R. Dewey, deparo-me com um fato curioso, que não deixa de merecer reflexão, não só pelo relevo destes dois escritores-pesquisadores no meio da comunidade científica, mas também porque trazem eles a lume um assunto que tem incomodado gerações após gerações, que é a discussão sobre as coincidências e acasos se contrapondo às evidências que fazem crer que há sim alguma força misteriosa e reger o mundo – e o universo – em ciclos abastecidos por ritmos quase sempre ao compasso simples diria que de um cantochão gregoriano.

Coincidência ou não, esta leitura vem em exato momento em que sou informado do retorno do emblemático Paulo Henrique Siqueira – o Paulão, a Peruíbe. Pois bem, antes de discutir a que veio Paulão de retorno a Peruíbe, gostaria de elevar o grau da discussão para um plano em que seja possível discutir, primeiro, se, afinal, ele algum dia foi embora de Peruíbe; e, segundo, num dogma mais abrangente, se retorna – acaso realmente tenha ido – a serviço de si mesmo, de terceiro, ou da própria História.

A teoria da História Cíclica, não obstante afirmar que “as forças humanas mais relevantes acabam motivando a ação humana a seguir uma ciclicidade” (idas e vindas ao mesmo ponto inicial), parece ter por companheira a curta lembrança das pessoas em relação aos acontecimentos pelos quais foram beneficiados, ou através dos quais foram prejudicados. É assim, por exemplo, com as eleições municipais no Brasil que seguem ciclo quadrienal. A cada ano eleitoral o resultado dos pleitos tende a seguir o retorno ao status quo ante, mesmo em detrimento da esperança do novo, da aposta no novo.

Dentre as forças relacionados como propulsoras da ciclicidade da História (Religião/Espiritualismo, a Política, a Ciência, a Filosofia, a curiosidade e a criatividade), parece mesmo que a Política é mola mestra.

Para Marco Túlio Cícero (106-43 a.C.), “a história é a testemunha dos tempos, a luz da verdade, a vida da memória, a mensageira da velhice”. Segundo o imortal filósofo e orador romano, “conhecer a história é se deparar com as ações de várias pessoas, independentemente da distância espacial e temporal que a separam”. Desta arte, a história teria uma função digamos pedagógica, de ensinar mesmo o indivíduo a pensar acerca de seu presente e a planejar seu futuro, sempre tendo como referência seu passado. Já o historiador alemão R. Koselleck (1923-2006) afirma que a História nos deixa livres para repetir os sucessos do passado, ao invés de incorrermos presentemente nos velhos erros. É bem possível que ambos – Roselleck e Cícero – tenham sustentando suas teorias em Heráclito de Éfeso, filósofo jônico que viveu de 535 a 475 a.C., para o qual “ninguém pode entrar duas vezes no mesmo rio, pois, quando nele se entra novamente, não se encontra as mesmas águas, e o próprio ser já se modificou”.

Trazendo esta discussão acadêmico-filosófica para o plano da realidade atual, e para complemento do estudo da História de Peruíbe, mormente a mais recente, temos por obrigação enumerar algumas nuances interessantes:

  • Como pretendia Cícero, até que ponto a insatisfação atual interfere no esquecimento das lembranças amargas do passado, a ponto de parecer desobrigar os indivíduos a aprender com estas mesmas lembranças amargas e, então, e só a partir delas, planejar melhor seu futuro?
  • A que “sucessos” e a que “mesmos erros” se referia Koselleck, ao inferir que a História nos deixa livres para fazermos nossas próprias escolhas no futuro?
  • Por último, será mesmo que, na tese de Heráclito de Éfeso, ao se adentrar novamente no rio, não obstante a certeza de no rio não encontrarmos as mesmas águas, “o próprio ser já se modificou”

Estas ponderações merecem discussão, amiúde terem respaldo na história político-administrativa de Peruíbe nestes seus 60 anos comemorados neste 18 de fevereiro próximo passado. Senão vejamos: Destes 60 anos, metade, ou 30 anos, o município foi administrado por um triunvirato composto por Gheorghe Popescu (já falecido) e Benedito Marcondes Sodré, como prefeitos se alternando no Executivo municipal, e Oswaldo Linardi (também in memorian), que pilotou o Legislativo por uma dezena de vezes como Presidente da Câmara, sendo que, quando não foi o piloto, era copiloto que mandava no piloto!

Se Mandino e Dewey tivessem tomado conhecimento deste detalhe da história de Peruíbe, é certo que teria merecido capítulo à parte no livro que estou a ler presentemente.

O fenômeno do revezamento Sodré-Popescu-Sodré tinha duas explicações lógicas: Primeiro, ambos se convertiam em inimigos vorazes nos anos eleitorais, para depois se comporem em seus objetivos pessoais evidente que pouco ou nada confessáveis, os dois tendo respaldo da claque de edis capitaneada por Linardi; segundo, porque ambos contavam com a curta memória do povo que, por 30 anos – e por sete eleições seguidas – repetiam o mote do “ah, eu era feliz e não sabia com Sodré (ou com Popescu)”. O segredo talvez estivesse na dieta de chuchu e abobrinha imposta ao povo. Era um povo marcado. Mas era um povo feliz!

Este ciclo pareceu tomar termo com o advento de uma “molecada” que “mal tirou as fraldas das bundas”, como diziam os coronéis ali pelos idos de 1980. Com a vitória de Mário Omuro em 1988 já era possível prever que o ciclo Sodré-Popescu cessara. Mas, fora ledo o engano. Em 1992 Sodré ganharia a eleição para cumprir seu quarto mandato como prefeito – e olha que, não por falta de vontade do agora octogenário Benedito, já teria tentando seu “penta” há bom tempo!

De 1996 para 2016 não houve mais repetição de nomes. Da mesma sorte, não houve uma só reeleição a se registrar nos anais peruibenses. Os outrora mandatários bem que tentaram, mas não lograram êxito em retornar ao Executivo. Assim foi com Mário Omuro, Alberto Sanches Gomes, Gilson Bargieri, Julieta Omuro e Milena Bargieri. A ex-prefeita Ana Preto (2013-2016) foi a única que se absteve de buscar aprovação popular para um segundo mandato consecutivo.

Feitas estas elucubrações e apontados os devidos registros históricos, parece mesmo que há certo grau de preocupação entre os tucanos de baixa plumagem de Peruíbe com relação ao retorno de Paulão em ano que antecede o ano eleitoral, e que costuma ser ano de ensaios e de se começar a esquentar as baterias rumo ao processo das eleições de 2020. Digo entre os tucanos de “baixa plumagem”, porque não creio mesmo que haja qualquer tipo de preocupação entre os tucanos de plumagem mais exuberante – leia-se o prefeito Luiz Maurício e sua competente equipe de técnicos, cada qual em sua área. Luiz Maurício demonstra firmeza ao afirmar que seu governo está dando certo, e que o pretendera ao se candidatar ao Executivo (e ao vencer as eleições de 2016) vem seguindo o ritmo proposto em seu programa de governo.

Agora, que as peças começam a se movimentar no tabuleiro da política local isso é verdade. O próprio retorno de Paulão, que, lembrando, foi peça chave na eleição de José Roberto Preto em 2004, e, depois, de Ana Preto, em 2012, é sinal mais que evidente que as forças políticas de Peruíbe haverão de começar a se organizar. Mas, não é só Paulão que pode incomodar o tucanato local. Nomes como José Ernesto Lessa Maragni Júnior (Zeca da Firenze ou Diácono Zeca) e Alex Pereira de Matos (Alex) também merecem registro pelas forças que certamente representam, e que estiveram fora por algum tempo, mas que, também, ou já voltaram, ou já vêm de ensaiar retornar para um estabelecimento mais definitivo e “mais perto” de onde as coisas acontecem em Peruíbe.

Zeca não esconde sua pretensão de tentar novamente o Executivo, ainda que siga afirmando que 2020 ainda é ano sabático para ele; e Alex Matos ainda continua sendo a maior “eminência parda” que o município já conheceu, desde que deixou uma reeleição praticamente ganha para vereador. Evidente que ambos são dois “elefantes” que, deveras, incomodam muita gente!

No que diz respeito a Paulão, marqueteiro político de jaez e estirpe, e que coleciona sucessos até mesmo como cantor de música romântica e popular, é de se ter certeza ao menos de uma coisa: não retornou ele a Peruíbe para ser ele mesmo candidato, ainda que certa feita tenha me confessado este seu intento, mas sim para estar a serviço de alguém. Resta saber de quem.

Se ele veio com o intuito de ilusionista, para uma tarefa que, decerto, não é lá tão difícil, de fazer a urbe esquecer como foram seus anos de “sucesso” como prefeito ad hoc, na tentativa de fazer retornar sua antiga chefe, a saber Ana Preto, é até mesmo possível que logre êxito. Como tenho dito desde sempre o povo tende a ter memória curta, e a ser, em certo sentido, até ingrato. E, não obstante as pesquisas e enquetes apontarem que o prefeito Luiz Maurício não só está no caminho certo, como também estar imprimido a melhor gestão pública de toda a história de Peruíbe, não é difícil prever que seu projeto de reeleição exigirá um esforço extraordinário à parte. Ele sabe disso.

Eu, de mim e para mim, torço para que as forças se conjuguem em torno daquilo que tem dado certo, para o bem comum, e não para atender vaidades e desejos espúrios pessoais. Quanto a Paulão, embora custe a crer que algum dia tenha efetivamente ido embora de Peruíbe, ainda assim, oxalá tenha retornado – e seja assim bem-vindo! – para somar. Sim, porque se veio para dividir, como dividido estiveram os candidatos em 2016, tenho a crer que, se Luiz Maurício se elegeu nas últimas eleições por obra de alguma força oculta que poderíamos chamar de “acaso”, em 2020, caso venha a se reeleger, não obstante todo o sucesso de seu governo, provará ser bem mais que advogado e administrador público: será mágico!

Consoante sabermos que pouco ou nada podemos coligir de efetivamente bom, perfeito, justo e honesto na história recente de Peruíbe, torçamos para que os ciclos tanto estudados por Og Mandino e Edward Dewey, portanto, falhem em 2020. Afinal, Peruíbe é, como fez acordar o prefeito Luiz Maurício, e deverá continuará sendo “uma cidade de todos”!

Que Deus salve Peruíbe das maldições do passado!

Washington Luiz de Paula

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